sexta-feira, 11 de setembro de 2009

A evolução dos conceitos sobre árvores filogenéticas - Parte 3

Leandro Pereira Tosta
e-mail: leandropereiratosta@gmail.com
Anna Carolina Russo
e-mail: annacarolinarcm@gmail.com

Universidade Federal do ABC.

"Um homem que ousa desperdiçar uma hora
ainda não descobriu o valor da vida."

Charles Darwin.

Resumo: As aproximações evolutivas apresentadas através das árvores filogenéticas são uma maneira de diminuir erros nas classificações entre organismos com estruturas similares, além de apresentarem as modificações das espécies ao longo de sua história evolutiva. Reconhecendo a importância de uma árvore filogenética, este ensaio trará mais alguns conceitos básicos para seu entendimento e análise.

Palavras-chave: árvores filogenéticas, cladogênese, Darwin, evolução, Linnaeus, parentesco.

Como comentado em postagens anteriores, é preciso compreender a importância do uso e correta interpretação das árvores evolutivas para melhor entendimento da evolução das características genéticas e morfológicas. O uso de árvores evolutivas é muito importante para compreensão da posição dos táxons tendo como base as relações colaterais ou de grupos-irmãos e os nós internos que representam a ancestralidade comum dos organismos.

Noções de que as espécies vivas devem ser classificadas da menor para a maior complexidade - como descrito por Lamarck – foram falseadas a partir dos estudos de Darwin, que passou a representar a diversidade através de árvores que se ramificaram a partir de um ancestral comum. Por volta dos anos 1950, o entomólogo alemão Willi Hennig propôs uma forma empírica de reconstruir as árvores evolutivas.

Na análise das árvores filogenéticas, muitos erros de interpretação são cometidos. Um dos erros cometidos freqüentemente é considerar o homem como topo da escala evolutiva. Esse assunto tão controverso já fora descrito em publicações anteriores. Gostaríamos de poupar o leitor do trabalho enfadonho de discutir a posição do homem a fim de poder desenvolver outros tópicos também de grande relevância à análise das árvores.

Outro erro muito cometido é conceber o ato da evolução como sendo linear, progressivo e unidirecional. Ouvimos no dia-a-dia aquela velha história de que “viemos” de organismos que, com o tempo, foram se “moldando”, ganhando complexidade até originar o que somos e como somos hoje. Esta idéia era corrente no século XVIII como, por exemplo, na obra do naturalista francês Buffon. Sabe-se hoje que a evolução se dá por meio da seleção natural e fenômenos aleatórios. Dessa forma, não se deve compreender a evolução como etapas lineares respeitando um processo matemático exato. A evolução se dá de forma lenta e gradual sem pulos atípicos de tempo, de forma não presumível por tabelas quando o organismo se apresenta em habitat natural.

Além do modo errôneo de como é compreendida a evolução, as árvores filogenéticas são freqüentemente mal interpretadas quando estamos falando do grau de parentesco entre as espécies. Geralmente, a primeira leitura para um leigo no assunto do grau de parentesco é ver qual espécie está mais próxima da outra espécie nos terminais da árvore, sem levar em consideração o padrão de ramificação entre elas ao longo da evolução. Como exemplo, temos a figura 2a, que mostra o grau de parentesco entre sapos, gatos, lagartos, peixes e seres humanos. Há uma forte tendência de pensar que o sapo está mais próximo dos peixes do que do ser humano, pois estão sendo analisados somente os pontos terminais. Se analisarmos os nós internos, podemos verificar que os sapos estão em um grupo mais inclusivo com os seres humanos do que os peixes. Além disso, pode-se dizer também que os seres humanos têm uma relação de parentesco maior com gatos do que com os sapos. Para facilitar, podemos girar os nos internos, como está demonstrado na figura 2b, para tirar a impressão de proximidade entre os sapos e os peixes. Figura 02. Árvore filogenética com o grau de parentesco entre sapos, gatos, lagartos, peixes e seres humanos sendo que a árvore 2b com os nós invertidos.

Uma última noção sobre as árvores filogenéticas é muito importante para sua interpretação: os seus pontos terminais não são necessariamente as espécies não extintas e seus nós internos os ancestrais que estão fossilizados. Na verdade, os ramos terminais podem ser TODAS as espécies conhecidas até hoje. As extintas, logicamente, são conhecidas pelos achados fósseis, mas não podemos considerar um achado fóssil como sendo o ancestral comum de um grupo de espécies, pois não podemos garantir que aquela espécie fóssil foi a precursora das outras que existem hoje. Portanto, temos que nos desfazer da prática intrínseca de procurar os inexistentes “elos perdidos”.
Figura 03. Diferentes espécies de tentilhões da ilha de Galápagos que deram base à teoria de Darwin.

Tida como ciência, a taxonomia é uma herança do sistemata Carolus Linnaeus no século XVIII. Nessa época, as classificações biológicas eram baseadas unicamente nas similaridades físicas. Hoje o critério de maior relevância para as classificações de cunho científico é o estabelecimento de relações de grupos-irmãos. Este critério foi desenvolvido para evitar a classificação errônea entre organismos dotados de estruturas similares que podem se modificar ao longo da história evolutiva.

A real diversificação das espécies é precedida por cladogêneses (Gregory, 2008), representado pela ramificação das árvores filogenéticas a partir de um ancestral comum.

Outro fato notório é a apresentação de ramos que representam as espécies ou grupos mais inclusivos. A presença de um ramo, representado na árvore, não significa necessariamente que nenhuma mudança tenha ocorrido (modificações que ocorrem dentro de uma espécie, mas que não levam à especiação são chamadas de anagenéticas). A representação dos ramos nas árvores pode designar táxons terminais um pouco diferentes dos organismos que deram origem à espécie (representado pelos nós internos).

Para melhor compreensão das árvores filogenéticas, deve-se ter em mente que o que importa não é sempre comparar complexidade de organismos dentro de um mesmo táxon, “galho”. Deve-se ter idéia de que a partir de um ancestral comum sempre haverá modificações originando organismos derivados e diferentes.

A partir do nó interno, uma espécie diverge em duas populações isoladas que apresentam a mesma descendência genética. Desta forma é possível compreender, mesmo que de forma simplificada, as modificações nos seres vivos atuais em relação aos seus ancestrais com o passar dos milhares de anos. Como por exemplo, pombos ancestrais originaram toda a diversidade de pombos que existem hoje.

Em suma, compreender a importância das árvores filogenéticas é crucial às modernas concepções sobre evolução. É necessário compreender que a evolução faz parte da história de todos os seres vivos, que sofrem modificações no decorrer do tempo, as quais podem ser selecionadas. Nesse contexto, as ferramentas usadas para análise dos passos evolutivos são as árvores filogenéticas.
Figura 04. Variedade de pombos que existem hoje.


Bibliografia:
Gregory, T.R, Understanding Evolutionary Trees, Evolution: Education and Outreach, vol. 1, n. 2, p. 121-137, 2008.
Santos, C.M.D., Os Dinossauros de Hennig: sobre a importância do monofiletismo para sistemática biológica. Scientia Studia, p.179-200; 2008.

Fonte das figuras:
-Figura 01.
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEikX6omkTo-SRlWwLUA-jGFtGkqt8WnYF6cq8bP7BJcjDAApQzlfNLr-nFxnAC2nKeBbNqqCpXVCQr2l9IHxj7A7ByheTs2ezF77dxVVjm__jFVXEFsE-wNTpuGD0K1MhmTt6aM2cSCb7Xt/s1600-h/%C3%81rvore+de+Inverno.bmp
-Figura 02.
Gregory, T.R, Understanding Evolutionary Trees, Evolution: Education and Outreach, vol. 1, n. 2, p. 121-137, 2008.
-Figura 03. http://www.notapositiva.com/trab_estudantes/trab_estudantes/biologia/biologia_trabalhos/darwin03.jpg -Figura 04. https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEihY0ypa1sVaxKLfN5Zi8Yk1i4uku3AqBhxvun5kjGHwqWmm2ryIbo9tyBtJkoKgn844KiVMX3X7SHdfkwCnrQCKMiRI-S21KMBfTQgbxXtuZj_tUOZxmM9KF6MdEATFdyjubVgCTZNFrMO/s1600-h/A.F.Lydon+Art_Selection_Pigeons.jpg