sexta-feira, 16 de abril de 2010

Como surgem os animais: alteração nas estruturas repetidas e variantes homeóticas

ResearchBlogging.org
Anna Carolina Russo C. Martin
anna.russocm@gmail.com

Antes de estudarmos a fundo os genes responsáveis pelo desenvolvimento de um animal, precisamos compreender como se dá seu desenvolvimento morfológico para que, desta forma, possamos procurar em seu material genético os genes responsáveis por expressar aquelas determinadas variações morfológicas. Podemos começar, então, observando a morfologia externa de um animal.

Uma formiga possui segmentos em seu corpo que podem ser descritos como partes semelhantes que se repetem ao longo de seu corpo. Seus segmentos seguem um mesmo padrão morfológico, porém se diferenciam em algumas partes dependendo de sua função, por exemplo, em um segmento temos a expressão de antenas e em outro a de apêndices locomotores (as chamadas pernas). Essas estruturas repetidas e de arquitetura modular (partes semelhantes) são muito encontradas entre os Metazoa, desde os primeiros registros fósseis dos organismos com simetria Bilateral. Um exemplo é a modularidade dos membros dos vertebrados com quatro patas, uma condição originada no ancestral comum dos tetrápodes.

Qualquer estrutura originária de uma mesma série repetida que sofreu diversas modificações e diferenciações é conhecida como homologia serial. Como exemplo, em alguns achados fósseis são encontradas estruturas repetidas, como os dentes, que, ao longo da evolução, modificaram-se, sendo selecionado um padrão da maquinaria dentária específica para cada hábito alimentar (como a presença de caninos em animais carnívoros). Temos que tomar cuidado para não confundirmos homologia serial com homologia no sentido de estrutura que surge no ancestral comum e se modifica a partir dele, estando presente nos seus descendentes. O termo homologia ainda não tem um consenso em sua definição, porém sabe-se que ela é a base da biologia comparada. Uma definição breve sobre homologia seria que ela se refere à comparação entre dois caracteres presentes em dois táxons distintos que foram originados de um mesmo ancestral. Esse tipo de comparação facilita o entendimento da evolução e é base da análise filogenética.

A observação das homologias seriais ao longo da evolução é muito importante para entendermos como se expressa a morfologia. Sabemos que a modularidade, simetria e polaridade são características básicas para a formação de um animal, portanto, uma vez conhecida as suas características morfológicas básicas, podemos procurar onde elas se originam e qual sua base de formação (que deve ser igual para todos, o DNA).

Podemos começar entendendo alguns experimentos que foram feitos por biólogos que tentavam descobrir algumas regras de formação dos animais através de cortes e mesclas de partes diferentes do embrião em diferentes fases de formação.

Um desses experimentos, em especial, foi o de Hans Spemann ver Carroll, páginas 45 e 46).
Ele usou um fio de cabelo de bebê para separar as metades do embrião na fase de gástrula (quando aparece o primeiro orifício do embrião, o blastóporo) de uma salamandra. Essas metades geraram girinos de salamandras normais. Em um segundo experimento, ele cortou novamente o embrião em duas partes, mas desta vez enlaçando-o perpendicularmente, o que gerou um girino e uma massa amorfa de células. Spemann chegou a conclusão de que o lábio dorsal do blastóporo era muito importante para o desenvolvimento embrionário. Com essa conclusão ele realizou um terceiro experimento no qual retirou o lábio dorsal do blastóporo de um embrião e colocou em outro blastóporo de outro, o que gerou um girino de salamandra com duas cabeças.

Bateson, um colecionador dessas anomalias, organizou, catalogou e descreveu inúmeros animais mutantes no tratado “Material for the study of variation”, de 1894. Ele classificou essas anormalidades em dois tipos básicos:

1º Número de partes repetidas alterado;

2º Uma parte do corpo assumira a parte de outra (originando as chamadas variantes homeóticas).

Essas mutações da segunda classificação são muito curiosas por se tratarem de alterações em genes isolados. Isso não significa, porém, que um organismo que sofreu tal mutação necessariamente originará uma nova espécie, uma vez que a seleção natural poderá impedir a transmissão de seus caracteres pelo fato dos organismos modificados serem, geralmente, inaptos à vida. Porém, isso não significa que esse tipo de mutações não possa gerar novas morfologias em um único salto evolutivo.

Com o estudo em drosófilas, descobriu-se que um pequeno número de genes homeóticos gera diferentes formas quando mutado. Isso indica que alguns poucos genes chamados de genes mestres “gerenciam” a diferenciação dessas partes do copo que são homólogas seriais, ou seja, originário de uma mesma série repetitiva que se diferenciou.

Uma vez entendido o funcionamento do surgimento de novas estruturas, temos que nos aprofundar no funcionamento desses genes mestres. Para isso, é preciso uma maior compreensão do DNA e do funcionamento dos genes, partindo da compreensão de suas estruturas nos diferentes animais.

Bibliografia:

CARROLL, S.B. 2006. Infinitas Formas de Grande Beleza: Como a evolução forjou a grande quantidade de criaturas que habitam nosso planeta. 1ª. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 09 – 55 p.
SANTOS, C.M.D. 2008. Os dinossauros de Hennig: sobre a importância do monofiletismo para a sistemática biológica. Scientiae Studia, 6: 179-200.
Santos, C.M.D., & Calor, A.R. (2008). Using the logical basis of phylogenetic as the framework for teaching biology Papeis Avulsos de Zoologia, 48 (18), 199-211

Referências figuras:
Richard C. Brusca, Gary J. Brusca, Invertebrates, 100
http://www.nature.com/nrm/journal/v7/n4/fig_tab/nrm1855_F1.html